quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Internacional

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05/11/2010

A revolta na ONU

(primeira parte)
A reunião de terça-feira passada, 26 de outubro, da Assembléia Geral da ONU, que se supõe seja a máxima autoridade política do planeta, foi convocada com um objetivo tantas vezes repetido que já se torna familiar: "Necessidade de pôr fim ao bloqueio econômico, comercial e financeiro imposto pelos Estados Unidos da América contra Cuba".

É o projeto mais discutido, mais aprovado e nunca cumprido na história das Nações Unidas.

Todos sabemos que, caso tal imputação fosse feita contra Cuba ou contra qualquer outro país latino-americano ou caribenho e fazer ouvidos moucos disso, sobre o dito país choveriam críticas. O ato detestável que com tanta clareza e precisão é atribuído aos "Estados Unidos da América", cujo fim vem sendo exigido, é classificado pelo direito internacional de "ato de genocídio".

Já são mais de 19 as vezes que, a partir do ano 1992, a referida resolução foi aprovada pela Assembléia Geral, exigindo o fim dessa abusiva e criminosa ação. Mas, da mesma maneira em que crescia o número de vezes em que a Resolução era reiterada e aprovada, também crescia o número de países que ofereciam seu apoio e diminuía o número daqueles que se abstinham e o minúsculo grupinho que votava contra. Na última votação apenas dois a rejeitaram e três se abstiveram, cujos nomes correspondem a pequenos Estados que, na verdade, são dependências coloniais dos Estados Unidos.

Um fato a levar em conta é que no mundo aconteceram grandes mudanças depois da fundação da ONU, quando ainda não tinham acabado os combates da Segunda Guerra Mundial, que custou 50 milhões de vidas e uma enorme destruição. Muitos países que hoje constituem a maioria das Nações Unidas ainda eram colônias das potências européias, as quais se apoderaram pela força do território da maior parte do mundo e, nalguns continentes, quase de sua totalidade. Milhões de pessoas, em muitos casos, de civilizações muito mais antigas e de cultura superior, foram submetidas ao colonialismo, em razão da superioridade das armas dos agressores.

Cuba não foi uma exceção.
Neste hemisfério, o nosso país foi a última colônia da Espanha devido a suas riquezas em produtos agrícolas escassos e muito procurados naquela altura, que surgiam das mãos trabalhadoras dos camponeses livres e de milhares de escravos de origem africana. Quando o resto das colônias da Espanha já era livre, nas primeiras décadas do século XIX, esta mantinha com mão de ferro e os métodos mais despóticos sua colônia em Cuba.

Na segunda metade desse século, nossa ilha, na qual a Espanha sonhou ter um baluarte para a reconquista de suas antigas colônias na América do Sul, foi berço de um profundo sentimento nacional e patriótico. O povo cubano iniciou a batalha por sua independência quase 70 anos depois do que as outras nações irmãs da América Latina, sem outra arma que não fosse o machete, com o qual se cortava a cana-de-açúcar e o brio e a rapidez dos cavalos crioulos. Em pouco tempo, os patriotas cubanos se converteram em soldados temíveis.

Trinta anos mais tarde nosso sofrido povo estava a ponto de conseguir seus objetivos históricos na luta heróica contra uma potência européia decadente mas obstinada. O exército espanhol, apesar do enorme número de soldados que tinha, já era incapaz de manter a posse da ilha, e apenas controlava as principais áreas urbanas e estava à beira do colapso.

Então, o pujante império, que nunca ocultou sua intenção de se apoderar de Cuba, interveio naquela guerra, após ter declarado cinicamente que "o povo da ilha de Cuba é e por direito deve ser livre e independente".

Depois de concluída a guerra, negaram ao nosso país o direito de participar das negociações de paz. O governo espanhol consumou a traição a Cuba colocando-a nas mãos dos interventores.

Os Estados Unidos se apoderaram dos recursos naturais, das melhores terras, do comércio, dos bancos, dos serviços e das principais indústrias do país. Converteram-nos numa neocolônia. Durante mais de 60 anos suportamos isso, mas nos fizemos independentes e jamais deixaremos de lutar. Com esses antecedentes, os leitores de outros países compreenderão melhor as palavras do nosso chanceler Bruno Rodríguez, no dia 26 de outubro deste ano. O debate começou às 10h da manhã.

Primeiramente, falaram cinco países em nome do Grupo dos 77, do Movimento dos Países Não-Alinhados, da União Africana, da Caricom e do Mercosul, todos eles apoiando a Resolução.

Mais tarde intervieram 14 países, entre eles dois que têm mais de um bilhão de habitantes cada um: a China e a Índia, com quase 2,5 bilhões entre ambos; outros que têm mais de cem, como a Federação da Rússia, Indonésia e o México; mais nove, com um reconhecido papel na vida internacional, a saber: Venezuela, a República Islâmica do Irã, Argélia, África do Sul, Ilhas Salomão, Zâmbia, Gâmbia, Gana e Barbados; foram 19 intervenções antes da de Bruno.
Seu discurso foi lapidário. Muitas vezes citarei parágrafos completos de suas palavras. Começou se referindo aos graves perigos de guerra que nos ameaçam e acrescentou:

"Para sobrevivermos, torna-se imprescindível um salto na consciência da Humanidade, só possível mediante a difusão de informação veraz sobre estes temas, que a maioria dos políticos oculta ou ignora, a imprensa não publica e que, para as pessoas, são tão horrorosos que parecem incríveis."

"...a política dos Estados Unidos contra Cuba não tem sustento ético ou legal algum, nem credibilidade nem apoio. Assim fica demonstrado com os mais de 180 votos nesta Assembléia Geral das Nações Unidas, que nos últimos anos exigiu o fim do bloqueio econômico, comercial e financeiro."

"O rechaço da América Latina e do Caribe é enérgico e unânime. A Cúpula da Unidade, efetuada em Cancún, em fevereiro de 2010, expressou-o resolutamente. Os líderes da região comunicaram-no diretamente ao atual presidente norte-americano. Pode reafirmar-se que o repúdio expresso ao bloqueio e à Lei Helms-Burton identifica, como poucos temas, o acervo político da região."

"Visões igualmente inequívocas foram referendadas pelo Movimento dos Países Não-Alinhados, pelas Cúpulas Ibero-americanas, pelas Cúpulas da América Latina e do Caribe com a União Européia, pela União Africana, pelas Cúpulas do Grupo ACP e praticamente por qualquer conjunto de nações que se tenha pronunciado a favor do Direito Internacional e do respeito aos princípios e propósitos da Carta da ONU."

"É amplo e crescente o consenso, na sociedade norte-americana e na emigração cubana nesse país, contra o bloqueio e a favor da mudança de política para Cuba. [...] os 71% dos estadunidenses advogam a normalização das relações entre Cuba e os Estados Unidos..."

"As sanções contra Cuba continuam inalteráveis e são aplicadas com toda dureza."

"No ano 2010, o bloqueio econômico recrudesceu e o seu impacto quotidiano continua sendo visível em todos os aspectos da vida em Cuba. Ele tem consequências particularmente sérias em setores tão sensíveis para a população como a saúde e a alimentação."

A seguir, enumera uma série de medidas cruéis que afetam sensivelmente as crianças com delicados problemas de saúde, que o governo dos Estados Unidos não poderia desmentir.

Depois expressa:
"As multas dos Departamentos do Tesouro e Justiça contra entidades de seu país e da Europa, neste último ano, por transações feitas com Cuba, entre outros Estados, ultrapassam no seu conjunto os US$ 800 milhões."

Continua informando:
"A confiscação de uma transferência de mais de 107 mil euros, pertencente à companhia Cubana da Aviação e realizada por meio do Banco Popular Espanhol de Madri a Moscou, foi uma verdadeira roubalheira."

A seguir, nosso ministro das Relações Exteriores exprime algo muito importante sobre os efeitos do grosseiro crime contra a economia de Cuba, devido à tendência de mencionar cifras históricas sobre o montante em dólares do valor de um bem móvel ou imóvel, um empréstimo, uma dívida o qualquer outra coisa que possa ser medida em dólares norte-americanos, sem levar em conta o valor constantemente decrescente do dólar, nas últimas quatro décadas. Como exemplo cito um refrigerante arqui-conhecido: a Coca Cola – sem cobrar nada pela publicidade. Há 40 anos custava cinco centavos, hoje seu preço flutua em qualquer país entre 150 e 200 centavos de dólar.

Bruno exprime:
"O prejuízo econômico direto provocado ao povo cubano, em conseqüência da aplicação do bloqueio, ultrapassa, nestes cinqüenta anos, US$ 751 bilhões, no valor atual dessa moeda."

Quer dizer, não comete o erro de usar a quantia das perdas que significou o bloqueio anualmente, como se o valor dos dólares fosse igual a cada ano. Em conseqüência desta estafa mundial que significou a suspensão unilateral, por parte do presidente Nixon, do respaldo em ouro dessa moeda, a uma taxa de 36 dólares por onça Troy, unida às emissões de dólares sem limite algum, o poder de compra dessa moeda diminui extraordinariamente. O ministério das Relações Exteriores solicitou a um grupo de peritos do Ministério da Economia fazer uma avaliação e o resultado foi o prejuízo econômico provocado pelo bloqueio contra Cuba ao longo destes 50 anos, expresso no valor atual dessa moeda.

"Em 2 de setembro passado" – disse Bruno na intervenção – "o próprio presidente Obama ratificou as sanções contra Cuba, arguindo o pretenso "interesse nacional" dos Estados Unidos. Contudo, todo mundo sabe que a Casa Branca continua prestando a maior atenção aos "interesses especiais", bem financiados, de uma exígua minoria que converteu a política contra Cuba em um negócio bem lucrativo."

"Recentemente, em 19 de outubro passado, o presidente Obama qualificou, segundo várias agências de notícias, de insuficientes os processos que, segundo sua opinião, têm lugar em Cuba e condicionou qualquer novo passo à realização das mudanças internas que gostaria de ver em nosso país."
"O presidente se engana ao pensar que tem direito de se intrometer e de qualificar os processos que hoje têm lugar em Cuba. É pena que esteja tão mal informado e assessorado."

"As mudanças que hoje empreendemos são devidas à vontade dos cubanos e às decisões soberanas de nosso povo. [...] Não têm por objetivo fazer a vontade do governo dos Estados Unidos, até hoje, sempre contrário aos interesses do povo cubano."

"Para a superpotência, tudo que não leve ao estabelecimento de um regime que se subordine a seus interesses será insuficiente, mas isso não vai acontecer, pois muitas gerações de cubanos dedicaram e dedicam o melhor de suas vidas à defesa da soberania e da independência de Cuba."

"Ao contrário, este governo continua com a prática arbitrária de colocar Cuba nas espúrias listas, inclusive, na dos Estados que, pretensamente, financiam o terrorismo internacional, feita pelo Departamento de Estado para qualificar o comportamento de outras nações. Este país não tem autoridade moral para fazer tais listagens — as que deveria encabeçar — nem existe uma só razão para incluir Cuba em nenhuma delas."

"O governo norte-americano mantém também em injusta prisão os Cinco cubanos lutadores antiterroristas, há mais de doze anos, em seus cárceres, cuja causa concitou a mais ampla solidariedade da comunidade internacional."
"Cuba, que foi e é vítima do terrorismo de Estado, exige deste governo o fim da dupla moral e da impunidade de que gozam em seu território os autores confessos de atos terroristas, perpetrados ao abrigo da política anticubana desse país..."

Nesse ponto, Bruno desferiu um duro golpe na delegação dos Estados Unidos com o famoso memorando do subsecretário assistente de Estado, Lester Mallory, revelado dezenas de anos mais tarde, que mostra o nojento cinismo da política dos Estados Unidos.

"A maioria dos cubanos apóia Castro (...) Não existe uma oposição política efetiva (...) O único meio possível para fazer-lhe perder apoio interno (ao governo) é provocar o descontentamento e o desânimo, mediante a insatisfação econômica e a penúria (...) É preciso utilizar imediatamente todos os meios possíveis para enfraquecer a vida econômica (...) negando a Cuba dinheiro e fornecimentos, com o fim de reduzir os salários nominais e reais, visando provocar fome, desespero e a derrubada do governo."

"Apesar de a perseguição econômica constituir o obstáculo principal para o desenvolvimento do país e para a elevação do nível de vida do povo, Cuba mostra resultados incontestáveis, que são de referência mundial, na eliminação da pobreza e da fome, na saúde e na educação..."

"Cuba pôde declarar aqui, há umas semanas, um elevado e excepcional cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Estes resultados conseguidos por Cuba ainda são uma utopia para boa parte dos habitantes do planeta."

"Cuba nunca deixará de denunciar o bloqueio e de exigir o direito legítimo de seu povo de viver e trabalhar em prol de seu desenvolvimento socioeconômico em pé de igualdade, cooperando com as demais nações, sem bloqueio econômico, nem pressões externas."

"Cuba agradece à comunidade internacional a firme solidariedade ao nosso povo, certa de que algum dia existirá justiça e não será mais necessária esta resolução."
"Muito obrigado".
Disse para concluir a sua primeira intervenção.
Continuará amanhã.

A revolta na ONU

(segunda e última parte)
Quando Bruno terminou sua intervenção quase no meio-dia de 26 de outubro passado, deu-se, como é regra, a explicação de voto, antes de o Projeto ser submetido à votação.

Primeiramente, falou o embaixador dos Estados Unidos, Ronald Godard, assessor principal da seção de Assuntos do hemisfério Ocidental, chefe da delegação de seu país. Suas inusitadas palavras tornam desnecessária a análise para demonstrar que as denúncias do ministro das Relações Exteriores de Cuba eram bem justas. Bastam suas afirmações para saber o cinismo da política desse país.
"...Os Estados Unidos […] estão firmemente engajados com o apoio à decisão do povo cubano de determinar livremente o futuro de seu país."

"...Os Estados Unidos […] têm o direito soberano de decidir suas relações econômicas com outro país. As relações econômicas dos Estados Unidos com Cuba são um assunto bilateral […] que visam a criar maior abertura em Cuba e maior respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais."
"Devemos levar isso em conta num debate eivado de argumentos retóricos do passado e focalizado em diferenças táticas, num debate que não faz nada para ajudar o povo cubano."

"Minha delegação lamenta que a delegação de Cuba continue, ano após ano, qualificando de maneira imprópria e incorreta as restrições comerciais a Cuba como um ato de genocídio. […] Os Estados Unidos não impõem restrição alguma à ajuda humanitária a Cuba..."

"Em 2009, os Estados Unidos […] autorizaram US$237 milhões em assistência humanitária privada, à maneira de presente, com alimentos e outros produtos essenciais, doações humanitárias não agrícolas e doações médicas."

Em abril de 2009, o presidente Obama salientou que ‘os Estados Unidos procuram um novo início com Cuba’, mas que ‘é preciso percorrer um caminho mais longo para ultrapassar décadas de desconfiança’. […] Iniciamos conversações para reatar o serviço postal direto entre os Estados Unidos e Cuba e incrementamos os intercâmbios artísticos e culturais..."

"O presidente Obama disse publicamente que a libertação dos presos políticos e as reformas econômicas são positivas para o povo cubano. Os Estados Unidos esperam ver em breve que tais promessas foram cumpridas, bem como a maior abertura por parte do governo cubano, como mostra de sua decisão de se relacionar construtivamente com seu próprio povo. […] Os Estados Unidos consideram que não se conseguirá plenamente uma nova era nas relações Estados Unidos-Cuba até o povo cubano desfrutar das liberdades políticas e econômicas internacionalmente reconhecidas, que este órgão tanto fez para defendê-las noutros países do mundo."

"Minha delegação votará contra esta resolução. Os Estados Unidos consideram que é hora de que este órgão junte seus esforços para apoiar o povo cubano na sua luta para decidir seu próprio futuro e ir além dos gestos retóricos que esta resolução representa.

"Obrigado, senhor presidente."

A seguir, a chefa da delegação da Nicarágua, cujo povo foi vítima da guerra suja de Ronald Reagan que tanto sangue custou, explicou sua intenção de voto. Suas palavras foram contundentes.

Realizou-se a votação e 187 países votaram a favor da Resolução; dois contra (Estados Unidos e Israel, seu forte aliado nas ações de genocídio), e três abstenções (Ilhas Marshall, Micronésia e Palau). Nenhum país dos 192 membros da ONU deixou de participar.

Após concluir esta, a representação da Bélgica, em nome da União Europeia, aliada dos Estados Unidos, pediu para as delegações que desejavam explicar seu voto.

Depois discursaram 16 países com trajetória destacada na política internacional, que explicaram sua votação a favor da Resolução. Eis a ordem: Uruguai, Bolívia, Angola, Mianmar, Suriname, Belarus, São Cristóvão e Névis, Laos, Tanzânia, Líbia, Síria, Sudão, Vietnã, Nigéria, São Vicente e Granadinas e a República Democrática Popular da Coreia.

Gostaria salientar que muitos países se abstiveram de discursar a pedido de nossa delegação, a fim de não alongar o processo de votação em detrimento do melhor horário para a divulgação do debate, e o esforço esgotador que significava a participação de um maior número de oradores. Apesar disso, 37 delegações falaram em termos claros e precisos a favor do justo Projeto que, pela décimo nona vez era aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas. Esta vez o debate sobre o delicado e importante tema foi mais extenso e enérgico.

Às 16h17, foi proferida a contestação de Cuba, através do ministro das Relações Exteriores de nosso país.

Suas palavras essenciais, apesar de todo o texto ter sido importante, foram:
"Senhor presidente:
"Agradeço muito as palavras dos treze oradores e das delegações presentes nesta imprevista sessão vespertina.
"A respeito das palavras expressas pelos Estados Unidos e pela União Europeia:
"Esta é a décimo nona ocasião em que a delegação dos Estados Unidos repete o mesmo argumento."
"O bloqueio é um ato de guerra econômica e um ato de genocídio."
"Será que o Departamento de Estado não fez a tarefa, não analisou o assunto?"
"No ano passado, li aqui os artigos das Convenções correspondentes..."
"Hoje li aqui o famoso Memorando do sr. Mallory."
"Não são ‘argumentos ideológicos’ do passado. O bloqueio é um velho iceberg que sobreviveu à Guerra Fria. O assunto não é a retórica, mas o ato de agressão a Cuba."

"O propósito dos Estados Unidos não é ajudar nem apoiar o povo cubano. Sabe-se que o bloqueio provoca carências e sofrimentos. Não provoca morte, porque a Revolução cubana o impede. Como compreender que punam as crianças cubanas, como foi exposto aqui? Se quisessem ajudar ou apoiar o povo cubano, a única coisa que fariam é pôr imediatamente fim ao bloqueio."
Por que impedem os norte-americanos de visitarem Cuba e de receberem informação de primeira mão? Por que restringem os chamados contatos ‘povo a povo’?"

"Os pretextos para o bloqueio foram mudando. Primeiramente, foi o fato de pertencer pretensamente ao eixo sino-soviético, depois, a chamada exportação da Revolução para a América Latina, mais tarde, a presença de tropas cubanas na África para ajudar a derrotar o apartheid, a preservar a independência de Angola e alcançar a da Namíbia."

"Depois, a manipulação a respeito dos direitos humanos. Contudo, o bloqueio é uma violação brutal dos direitos humanos dos cubanos."

"Estamos dispostos a debater sobre a violação dos direitos humanos. Podemos começar pelo campo de concentração de Guantánamo, onde se pratica a tortura e não existe o habeas corpus. É o reino das ‘comissões militares’, fora do Estado de Direito. Por acaso a delegação norte-americana pode explicar o que aconteceu nos campos de Abu Ghraib, Bagram e Nama?"

"Foram indiciados os responsáveis? Foram processados os que autorizaram nos governos europeus os cárceres secretos na Europa e os voos secretos da CIA com pessoas sequestradas? Pode o representante da União Europeia responder a isso?"

"Podemos falar da Wikileaks. Por que não contam alguma coisa a respeito das atrocidades que aparecem nos 75 mil documentos sobre os crimes no Afeganistão e os 400 mil sobre o Iraque?"

"As mudanças em Cuba são assunto dos cubanos. Vamos mudar tudo aquilo que deva ser mudado para o bem dos cubanos, mas não pediremos opinião ao governo dos Estados Unidos. Escolhemos livremente o nosso destino. Foi para isso que fizemos uma Revolução. Haverá mudanças soberanas, não ‘gestos’. Sabemos que para os Estados Unidos a única solução seria instaurar em Cuba um governo pró-ianque. Mas isso não vai acontecer."

"Desejam os Estados Unidos cooperação entre nossas universidades? Então, eliminem as restrições aos intercâmbios acadêmicos, estudantis, científicos e culturais e permitam assinar acordos entre essas instituições."
"Desejam cooperação no combate ao narcotráfico, ao terrorismo e ao tráfico humano, nos desastres naturais, no correio postal? Então que respondam, quando menos, às propostas que apresentamos há mais de um ano, sem condição alguma."

"Um alto funcionário da Usaid confirmou ontem ao jornalista Tracey Eaton que, no último período, enviaram US$15,6 milhões a (cito) ‘indivíduos no território de Cuba’. É assim que chamam seus mercenários."

"As transmissões ilegais de rádio e televisão continuam."

"Os Cinco cubanos presos nos EUA permanecem cumprindo injustamente prisão. Há pouco, Gerardo Hernández Nordelo foi submetido, sem razão alguma, a confinamento na solitária e lhe foi denegado atendimento médico."

"Terroristas internacionais confessos como Orlando Bosch e Posada Carriles andam à solta em Miami e, inclusive, fazem ali atividade política."

"O bloqueio é abusivamente extraterritorial e prejudica todos os aqui presentes. Não é um ato bilateral."

"Senhor presidente:
"Quanto às palavras expressas sobre a União Europeia, não tenho muita coisa que acrescentar."
"Não lhe reconhecemos autoridade moral nem política alguma para criticar em matéria de direitos humanos."
"Seria melhor que atendesse à brutal política que aplica contra os imigrantes, a deportação de minorias, a violenta repressão contra os manifestantes e a crescente exclusão social de seus desempregados e setores de mais baixa renda."
"O Parlamento Europeu, com a maior desfaçatez e de maneira infame, dedica-se a remumerar os agentes do governo dos Estados Unidos em Cuba."
"Contudo, a União Europeia sonha se acredita que vai normalizar as relações com Cuba existindo a chamada Posição Comum."
"Muito obrigado."

Todos estávamos à espera da resposta dos Estados Unidos à contestação de Bruno. O embaixador e a delegação — que não abandonaram a sala, em sinal de rejeição — resistiram ao bombardeio de argumentos irrebatíveis. A contestação de Cuba deixou-os pasmados. Tive a sensação de que iam se esvaindo aos poucos, até sumirem do palco.

Durante 50 anos de bloqueio, a superpotência não conseguiu nem conseguirá derrotar a Revolução Cubana. Não me dediquei ao exercício de escrutinar os votos a favor ou contra a "Resolução". Constatei, no entanto, o calor e a convicção dos que se pronunciaram contra a injusta e arbitrária medida. É um erro acreditar que tal medida pode se manter indefinidamente. Foi uma revolta. Os povos estão já fartos de agressões, pilhagem, abusos e enganos.

Nunca antes as delegações expressaram com mais veemência seu protesto contra a caçada que implica o menosprezo pela justa condenação da comunidade mundial contra um ato de genocídio que se repete ano após ano. Estão cientes de que o mais sério é o saque sistemático de suas reservas naturais imposto à maioria dos povos do planeta, a crescente escassez de alimentos, a depredação do meio ambiente, o número crescente de guerras de genocídio contra outros povos, apoiadas em bases militares situadas em mais de 75 países, e o crescente perigo de uma conflagração suicida para todos os povos do mundo.

A ONU não pode existir sem a presença dos povos que vêm exigindo o fim do bloqueio. Essa instituição, surgida quando a imensa maioria de nós nem sequer era independente, para quê serve sem nós? Qual o nosso direito, se nem sequer podemos exigir o fim do bloqueio imposto contra um pequeno país? De uma maneira ou outra, fomos subordinados aos interesses dos Estados Unidos e da OTAN, organização militar bélica que despende mais de um trilhão de dólares a cada ano em guerras e armas, que seriam suficientes demais para dar o necessário a todos os povos do mundo.

Muitos países do Terceiro Mundo são obrigados a encontrar soluções, independentemente do que aconteça aos outros. É como andar sobre uma esteira que funciona na contramão à maior velocidade.

Faz falta uma ONU verdadeiramente democrática e não um feudo imperial, onde a imensa maioria dos povos não importa nada. A ONU, fundada antes do fim da Segunda Guerra Mundial, está já esgotada. Não permitamos que nos imponha o ridículo papel de nos reunirmos mais uma vez daqui a 12 meses para zombar de nós. Façamos com que nossa exigência seja escutada e salvemos a vida de nossa espécie antes de que seja muito tarde.

Fidel Castro Ruz é ex-presidente de Cuba.

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